Alemanha volta ao jogo da memória com nova tecnologia que une DRAM e armazenamento persistente
Uma nova parceria entre a startup alemã Ferroelectric Memory Company (FMC) e a empresa de testes Neumonda marca o renascimento da fabricação de memória na Europa. As duas companhias anunciaram o desenvolvimento da DRAM+, uma memória baseada em tecnologia FeRAM que pretende unir velocidade comparável à DRAM tradicional com a vantagem de manter os dados mesmo sem energia, como um SSD.
FeRAM baseada em óxido de háfnio: o pulo do gato
Diferente das antigas versões da FeRAM que utilizavam materiais como PZT (zirconato-titanato de chumbo), a inovação da FMC está no uso de óxido de háfnio (HfO₂) como material ferroelétrico.
Tal tecnologia traz duas grandes vantagens: o material é compatível com processos CMOS (os mesmos usados em semicondutores modernos) e escala bem abaixo dos 10 nanômetros, permitindo produção em larga escala com alta densidade.
Ao aplicar o efeito ferroelétrico do HfO₂ a uma DRAM, transformamos o capacitor tradicional em um dispositivo de armazenamento de baixa potência e não volátil, mantendo o desempenho elevado da DRAM
Thomas Rueckes, CEO da FMC

Comparativo entre tipos de memória
Memória | Volátil? | Velocidade | Consumo de Energia | Retém Dados sem Energia? | Densidade | Custo | Aplicações Comuns |
---|---|---|---|---|---|---|---|
DRAM | Sim | 🟢 Muito alta | 🔴 Alto | ❌ Não | 🟢 Alta | 🟡 Médio | Memória RAM de PCs, servidores e dispositivos móveis |
NAND Flash | Não | 🟡 Média | 🟢 Baixo | ✅ Sim | 🟢 Muito alta | 🟢 Baixo | SSDs, pen drives, cartões de memória |
FeRAM (PZT) | Não | 🟡 Média | 🟢 Muito baixo | ✅ Sim | 🔴 Muito baixa | 🔴 Alto | Smartcards, sensores, dispositivos industriais |
DRAM+ (HfO₂) | Não | 🟢 Muito alta (≈DRAM) | 🟢 Baixo | ✅ Sim | 🟡 Alta (em evolução) | 🟡 Médio-alto | IA, automotivo, medicina, edge computin |
🔍 Notas explicativas:
- Volatilidade: memórias voláteis perdem os dados ao desligar o equipamento. As não voláteis retêm as informações mesmo sem energia.
- Velocidade: DRAM e DRAM+ são muito mais rápidas para leitura/escrita do que NAND e FeRAM comum.
- Consumo: FeRAM e DRAM+ consomem menos energia que DRAM tradicional, o que as torna ideais para aplicações sensíveis a consumo.
- Densidade: NAND Flash ainda é a campeã em capacidade por chip, mas DRAM+ está evoluindo rápido com o uso de HfO₂.
- Custo: NAND é barata, DRAM é razoável, mas FeRAM tradicional é cara e limitada. DRAM+ promete equilibrar performance e viabilidade.

Memória para IA, automóveis, medicina e mais
A FMC acredita que sua nova memória pode atender a uma variedade de setores, como inteligência artificial, indústria automotiva, dispositivos médicos, aplicações industriais e eletrônicos de consumo.
O foco está em equipamentos que exigem alta velocidade e consumo de energia otimizado, além da capacidade de manter dados mesmo em situações de queda de energia.
Aplicações práticas da nova memória DRAM+ (FeRAM com HfO₂)
- Aeronáutica, espaço e defesa: aplicações em ambientes extremos, como satélites ou aeronaves, onde falhas elétricas são comuns e a memória precisa ser confiável e resistente.
- Carros autônomos: armazena dados de sensores e decisões críticas em tempo real, sem risco de perda em caso de queda de energia, mantendo a segurança do sistema mesmo em falhas.
- Dispositivos de IA embarcada (edge AI): permite que câmeras inteligentes, drones e dispositivos médicos tomem decisões rápidas localmente, sem depender da nuvem, com baixo consumo e dados preservados.
- Equipamentos médicos portáteis: ideal para armazenar registros vitais de pacientes ou históricos clínicos em dispositivos móveis, mantendo os dados mesmo após desligamentos inesperados.
- Controle industrial e automação: registra configurações e logs de processos em tempo real, mesmo em ambientes sujeitos a interrupções de energia frequentes.
- Substituto para RAM em computadores críticos: indicado para servidores e estações de trabalho que exigem velocidade de DRAM, mas não podem correr o risco de perder dados em reinicializações.
- Eletrônicos de consumo com boot instantâneo: possibilita smartphones ou notebooks que ligam instantaneamente, sem necessidade de recarregar o sistema operacional, pois os dados permanecem na memória.
Histórico e evolução da FeRAM
A FeRAM não é novidade, mas sempre esbarrou em limitações técnicas. As versões anteriores, baseadas em PZT, tinham dificuldades para se integrar aos processos padrão da indústria e ofereciam capacidades muito limitadas — geralmente entre 4MB e 8MB. Além disso, suas estruturas como a 1T1C (um transistor e um capacitor) ocupavam muito mais espaço que as células de memória convencionais.
A virada veio com o HfO₂, que permite fabricar chips muito mais densos, com capacidade na faixa de Gigabits até GigaBytes, aproximando-se do desempenho e da capacidade da DRAM, mas com benefícios adicionais como não volatilidade e menor consumo energético.
Linha do tempo da FeRAM (Memória Ferroelétrica)
Ano / Período | Marco |
---|---|
1952 | Primeiro conceito de memória ferroelétrica é proposto, mas ainda sem aplicação prática. |
1980s | Início dos primeiros protótipos de FeRAM usando materiais como PZT (zirconato-titanato de chumbo). |
1995 | Lançamento dos primeiros chips comerciais de FeRAM com capacidade limitada (KBs a poucos MBs). |
2000–2010 | FeRAM começa a ser usada em aplicações específicas: cartões inteligentes, sensores industriais, RFID. |
Limite técnico | Apesar do sucesso em nichos, o uso de PZT limita a escalabilidade da FeRAM — difícil integração com CMOS. |
2011 | Pesquisadores descobrem efeito ferroelétrico em óxido de háfnio (HfO₂), compatível com CMOS. |
2015–2018 | Laboratórios e startups iniciam testes com FeRAM baseada em HfO₂, superando barreiras de densidade. |
2020 | Ferroelectric Memory Company (FMC) é fundada para comercializar essa nova geração de memória. |
2024–2025 | FMC anuncia parceria com Neumonda para desenvolver a DRAM+ — memória rápida, não volátil e de alta capacidade. |
Futuro próximo | Espera-se que DRAM+ seja aplicada em IA, automotivo, medicina, edge computing e muito mais. |

Neumonda: a aliada nos testes e no retorno da indústria europeia
Para testar e validar a nova tecnologia com eficiência e baixo custo, a FMC contará com a expertise da Neumonda, que oferecerá acesso às suas plataformas avançadas de testes: Rhinoe, Octopus e Raptor.
Esses sistemas permitem uma análise detalhada e energeticamente eficiente, superando o desempenho dos equipamentos de teste tradicionais.
Um dos meus objetivos ao fundar a Neumonda foi trazer a indústria de semicondutores de memória de volta para a Europa. Esta colaboração nos leva um passo mais perto disso
Peter Poechmueller, CEO da Neumonda
Leia também:
- Startup Fourier aposta em eletrólise inspirada em Data Centers para baratear produção de hidrogênio
- Lightmatter apresenta superchip fotônico que supera os limites atuais para interconexões em IA
- Rússia apresenta ferramenta de litografia com tecnologia de 350nm décadas atrás da concorrência
Mais do que um chip: uma missão continental
Com a união de forças entre FMC e Neumonda, além de um novo produto promissor, a Europa ganha uma nova chance de reconstruir sua presença no setor de semicondutores, particularmente no segmento de memória — hoje dominado por fabricantes asiáticos. Afinal, a DRAM+ pode impulsionar a inovação em áreas críticas e também reforçar a autonomia tecnológica europeia.
Fonte: Ferroelectric Memory Company (FMC)