Análise | Ambidextro – O jogo que te obriga a virar um polvo emocional
Você sabe o que é tentar tomar café enquanto segura o celular, abre a porta e ainda disfarça a crise existencial? É tipo isso que Ambidextro quer que você sinta — só que num plano 2D e com uma trilha sonora que parece ter saído de um ritual satânico feito num fliperama abandonado.
A premissa é simples: um mago foi partido ao meio (mentalmente já me identifiquei), e agora você precisa controlar suas duas metades, ao mesmo tempo, cada uma com um analógico diferente. Parece fácil? É porque você ainda não jogou.
Quando coordenação vira filosofia
Em um mundo onde até andar em linha reta virou tarefa multitarefa, Ambidextro entrega um gameplay que é metade plataforma, metade tortura cognitiva. Você controla as duas metades do mago — que, pra mim, são claramente os lados do cérebro depois de um burnout — e tem que levá-los até o centro do mapa. Juntos. Sem morrer.
Spoiler: você vai morrer.
Várias vezes.
E cada morte parece um lembrete gentil de que talvez, só talvez, você não esteja tão no controle quanto achava da sua própria cabeça. É tipo Celeste, se ela tivesse sido escrita depois de uma briga feia entre o lado emocional e o racional da protagonista.
O caos é bonito (quando visto de longe)
Visualmente, o jogo é uma delícia. Pixel art no estilo que parece ter sido programado em um disquete de 1.44 MB, mas com corações quebrados em alta definição. Cada fase é um palco minimalista onde a simetria é lei — e a dissonância é castigo.
A estética lembra aquelas animações educativas dos anos 80, mas com uma pitada de apocalipse mental. Sabe aquele fundo preto que dá a sensação de abismo existencial? Tem. Sons de pressão interna simulados com notas dissonantes em sintetizador? Check. Metáfora visual para estresse crônico? Provavelmente.
Um teste de QI emocional disfarçado de game
Jogando Ambidextro, tive flashbacks de quando tentei aprender a dirigir e descobrir onde ficava a embreagem. Só que aqui, a embreagem é seu lado esquerdo do cérebro, e o freio de mão é a ansiedade que cresce a cada erro.
A cada fase, a dificuldade sobe um degrau. E não é aquele “ah, agora tem espinhos”. É mais tipo “e se você tivesse que coordenar dois personagens invertidos, com gravidade alternada, enquanto ouve uma música de boss final do Castlevania?”. O jogo não te ensina — ele te joga no palco e espera que você dance. É cruel? Sim. É genial? Também.
Trilha sonora: Dungeon Synth ou sessão de terapia medieval?
A trilha do jogo merece um parágrafo só dela. É tipo se o Death Grips tivesse um filho com Final Fantasy Tactics e decidisse fazer só música instrumental usando um teclado de brinquedo da década de 90.
Mas ela encaixa. Encaixa no jeito que tudo parece pesado, urgente, e um pouco errado. Ela dita o ritmo dos seus erros. A cada nota, você sente que o tempo está contra você — e a estética musical conversa com o sentimento do jogo: você está preso num ciclo de tentativa e falha, mas existe beleza até aí.
Ambidextro como experiência, não como jogo
A parte mais legal de Ambidextro é que ele nem tenta te entreter. Ele quer que você entenda. Que você sofra. Que você perceba que controlar dois lados de si mesmo ao mesmo tempo é tão difícil quanto manter equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, ansiedade e apatia, ou memes e livros de filosofia.
Você não joga Ambidextro pra se divertir. Você joga pra se provar. É um tipo de jornada interior que parece bobinha, mas te ensina coisas. Tipo que você não é tão bom multitarefa quanto achava. Ou que seus reflexos talvez estejam vencidos. Ou que seu lado esquerdo não conversa bem com o direito (alô, psicoterapia!).
Comparações que ninguém pediu (mas que Magali faz mesmo assim)
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Ambidextro é o Inside da coordenação motora.
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É Super Meat Boy com o dobro de culpa.
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É o Portal do design emocional, se a GLaDOS fosse um timer e o cenário não tivesse piedade nenhuma.
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É tipo brigar com você mesmo jogando Overcooked, só que sem risadas no final.
Prós:
- Estética retrô que bate forte na nostalgia emocional
- Desafio cerebral honesto e sem condescendência
- Trilha sonora que parece feita por um bruxo de 8 bits
- Narrativa sutil sobre divisão, identidade e sanidade
Contras:
- Pode causar frustração extrema (sem garantia de paz interior)
- Falta de acessibilidade pra quem tem dificuldades motoras
- Nenhum momento de descanso: o jogo exige 100% do tempo todo
- Algumas fases parecem feitas pra te humilha
Nota Final: 7/10
Se você joga videogame como forma de escapar da vida, Ambidextro vai te lembrar que sua cabeça ainda está lá. Mas, se você joga pra entender, questionar e talvez se reconstruir, esse jogo é quase uma pequena epifania em forma de botão “Start”. É frustrante, é difícil, e às vezes parece que foi feito pra te irritar. Mas quando você completa uma fase, quando você junta o mago partido — mesmo que por um segundo — parece que você também juntou algo em você. E isso, no fim das contas, é o que torna Ambidextro um dos jogos mais humanos e sarcásticos do ano.
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