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Dia do Orgulho Nerd: pare de ser chato e lembre das coisas importantes

Chegou o dia que usamos para celebrar nossas maiores paixões, usando camisetas temáticas, buscando referências, jogando aquele game que conquistou nosso coração, ouvindo canções de outsiders, viajando na imaginação de livros complexos e divertidos ou simplesmente mergulhando nos nossos arcos de quadrinhos favoritos. O Dia do Orgulho Nerd nasceu em um época que a internet ainda estava engatinhando, não era tão fácil como hoje encontrar alguém que gosta de Husker Dü, Philip K. Dick, adventures textuais, role playing games e filmes do Tartakovsky; foi criado para finalmente reunir em uma comunidade aqueles que não se encaixavam no “padrão” e se sentiam marginalizados — e parece que muita gente esqueceu disso.

Mas será que ainda vale a pena ser chato e cobrar certas posições que talvez não se enquadrem mais nesse momento tão importante? Ser nerd hoje em dia é mais do que a lembrança de uma comunidade marginalizada e esquecida. É algo a ser celebrado com pessoas que dividem as mesmas paixões que as nossas, em toda a sua diversidade.

Então, por que ainda há tanto preconceito dentro desse espaço que deveria ser acolhedor? Está na hora de deixar alguns pontos de lado e provar que ser nerd é legal, inclusivo e aberto para todos aqueles que quiserem fazer parte da comunidade.


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Por que o dia 25 de maio?

Antes de nos aprofundarmos mais nesse assunto, vale a pena revisitar como tudo isso começou. Afinal, muita gente não sabe de onde a comemoração do Dia do Orgulho Nerd se iniciou.

Na realidade, duas felizes coincidências se encontraram e formaram a data que conhecemos atualmente. Tudo começou em 2001, quando um grupo de fãs de Douglas Adams decidiu homenageá-lo após a sua morte. Então, no dia 25 de maio daquele ano, esses fãs saíram com toalhas penduradas nos ombros ou mochilas, numa clara referência ao Guia do Mochileiro das Galáxias, como forma de uma homenagem prática e bem-humorada.

A referência em questão vem do livro, onde Adams descreve a toalha como o item de maior utilidade para um mochileiro interestelar, podendo ser um agasalho, servir de proteção, virar uma vela para uma jangada e, até mesmo, uma arma improvisada. Sendo assim, a homenagem a Douglas Adams com o Dia da Toalha tornou-se um daqueles easter eggs que todo nerd ama encontrar e compartilhar.

Alguns anos depois, em 2006, fãs espanhóis decidiram expandir ainda mais esse espírito de celebração. Embora todo mundo sempre tenha gostado de Star Wars em sua estreia, foram os nerds que abraçaram com paixão o Episódio IV, Uma Nova Esperança, lançado em 25 de maio de 1977.  Essa mesma data, então, foi estabelecida para celebrar um dia dedicado aos outsiders apaixonados por mundos imaginários, fantasia, ficção científica e tudo mais que a criatividade literária serviu para acolher quem gostava mais de perguntas do que de respostar — e isso se transformou em filmes, séries, jogos, e muito mais.

Como dá notar em Mulher Nota 1000, nerd não precisa ser esperto ou inteligente (Imagem: Reprodução/Universal Pictures)

Sendo assim, a união dessas duas datas comemorativas – o Dia da Toalha e o aniversário de lançamento de Star Wars – deu origem ao Dia do Orgulho Nerd como o conhecemos, um momento para celebrar essa cultura e identidade. Afinal, antes da recente popularização da cultura pop, impulsionada em grande parte pelo sucesso do universo cinematográfico da Marvel, ser nerd não era visto como algo tão legal pela maioria.

Muita coisa mudou para melhor, mas bastante gente esqueceu que os nerds seguraram a tocha quando Star Wars passou mais de 20 anos sem um filme no cinema; foram eles que também acolheram quem se sentia solitário e não era compreendido, assim como também foi essa comunidade que passou a usar os números e as palavras para melhorar muita coisa no mundo.

Nerd não é quem tem mais carta Magic, coleção completa do Sandman ou sabe de cor os textos de Silmarillion. O nerd sempre convive com a diferença sem julgar, observas diferentes perspectivas, compreende os que buscam conhecimento na cultura alternativa e é solidário com quem se sente solitário por não ser como a maioria das pessoas.

É bacana ser nerd

Por incrível que pareça para alguns hoje, antigamente muitas pessoas sofriam com os rótulos de “nerd”, “CDF” e outros termos pejorativos. Com toda certeza, você que está lendo, se pegou essa fase, deve ter passado por momentos de ser visto como o esquisitão da turma por gostar demais de quadrinhos, mergulhar em livros de fantasia, se amarrar nos jogos de videogame ou se fascinar por ciência e tecnologia de uma forma que outros não compreendiam.

Porém, essa história mudou, e isso trouxe um alívio para muita gente que passou por maus bocados com certa perseguição na época da escola. Para mim, que sempre fui uma nerd de carteirinha, isso é um marco extremamente positivo.

Afinal, podemos agora celebrar nossas coleções e interesses – sejam eles games, HQs, action figures, livros, filmes e séries de ficção científica e fantasia, tecnologia e ciência, ou os complexos mundos de um RPG – com outras pessoas que dividem o mesmo amor que a gente. Podemos falar sobre aquilo que tanto gostamos sem o julgamento que antes vinha acompanhado de uma careta. E que fomos fortes até demais por aguentar piadinhas e provocações enquanto a gente só queria ler, jogar ou falar sobre nossas paixões em paz.

Os adventures textuais uniram literatura de fantasia e ficção científica com tecnologia e programação, como na adaptação de The Hobbit (Imagem: Reprodução/Beam Software)

É muito bacana você se juntar com pessoas que dividem essa mesma paixão, que podem te escutar, trocar figurinhas e participar de momentos importantes junto de personagens e universos que você também ama. Um momento que vale ser referenciado, e com certeza muita gente vivenciou intensamente, foi a estreia de Vingadores: Ultimato nos cinemas. A sala parecia um estádio de futebol em final de campeonato.

Viver esse momento, com toda certeza, foi um marco para a nerd que era alvo de piadinhas na escola. E ter a chance de estar com pessoas que vibram com aquilo que você ama traz um poderoso sentimento de pertencimento a um grupo que era constantemente feito de chacota. É de uma grandeza e importância imensurável para todo mundo que passou por esses tempos mais solitários.

Ainda há o que mudar

E é aqui que entramos em um ponto que merece destaque. Mesmo sendo um grupo que historicamente foi alvo de ataques, por que ainda vemos aquele nerd chato se incomodando com certas coisas e tentando impor suas visões de forma excludente?

Por ser parte de um grupo que enfrentou piadas, brincadeiras de mau gosto e situações desrespeitosas, os nerds deveriam ser aqueles que mais compreendem o impacto negativo de ataques e xingamentos. E, infelizmente, apesar dos avanços dentro da comunidade, certos comportamentos tóxicos persistem.

Na música, Weezer ajudou a reunir os nerds com canções que tinham tudo a ver com o universo de quem gostava de X-Men, ouvia Kiss lendo literatura do século XIX enquanto esperava o próximo episódio de Twin Peaks (Imagem: Reprodução/Marvel Comics)

Ainda é comum ver o machismo escancarado, o racismo, a homofobia e outros preconceitos reinando em certos fóruns, comentários e interações online. Acredito que o Dia do Orgulho Nerd seja um momento não apenas de celebração, mas também de reflexão crítica, para que a comunidade continue a evoluir e a trazer um peso positivo para esta data tão importante.

Por isso, não vale a pena ser o “nerd chato” diante dessas questões. Lembre-se que você já pode ter sofrido o mesmo que muitas pessoas da comunidade ainda estão passando. Estamos juntos, ou deveríamos estar, unidos por uma causa maior que vale a pena lutar: um espaço nerd mais acolhedor e representativo. Não se trata de querer ser mais inteligente que ninguém, mas sim de agregar mais valor e respeito ao nosso universo compartilhado.

É por isso que o Dia do Orgulho Nerd merece ser celebrado: pelas portas que foram abertas para que mais pessoas se juntassem a nós; por aqueles que não conheciam tanto sobre certos temas e tiveram a oportunidade de aprender com os mais experientes de forma acolhedora. A comunidade nerd precisa ser cada vez mais receptiva. Mesmo que tenha melhorado, ainda há muita coisa para ser feita.

Portanto, não seja chato. Use esta data como um espaço para trazer mais pessoas para o seu mundo e compartilhar suas paixões de forma entusiasmada e respeitosa. É importante que você sempre se lembre que há lugar para mais gente, que ter uma data para comemorar um grupo que já foi tão excluído é algo incrível, e que podemos falar sobre o que quisermos de forma tranquila e construtiva. É sobre o momento, as trocas com outras pessoas, a celebração de vários fãs juntos.

Philip K Dick ajudou a estabelecer a ficção científica com seu universo cyberpunk (Imagem: Reprodução/Timba Smits)

Que o Dia do Orgulho Nerd seja sempre lembrado como um espaço para nós, apaixonados pelos universos fantásticos de Tolkien, pela complexidade social de George R.R. Martin, pela criatividade de Stan Lee, pela aventura de George Lucas, pela genialidade de Ursula K. Le Guin, pela visão de Isaac Asimov e tantos outros nomes importantes que moldaram nossa imaginação. Que possamos celebrar cada vez mais em um espaço digno, diverso e menos tóxico. Que a Força Esteja conosco, e, por favor, não entre em pânico!

*Colaborou Claudio Yuge

Leia a matéria no Canaltech.

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